sábado, 3 de dezembro de 2011

Noites no Museu


O Museu Nacional de Machado de Castro, ofereceu a alguns dos seus funcionários, estagiários e voluntários uma formação em "Comunicação e Design na Promoção do Museu", com o formador Pedro Góis.
No final, criamos uma situação hipotética para podermos trabalhar a sua promoção. Eu trabalhei à volta das Noites no Museu, o que me permitiu a criação de um cartaz, um flayer e um desdobrável.
O desdobrável é mais dinâmico, permite às cortinas dispostas no plano de fundo se abram para a apresentação da agenda cultural das noites do museu.
Mesmo assim, espero que gostem...

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Héracles

         Filho de Zeus e de uma mulher mortal, Alcmena, ou seja, um semi-deus. Mas nem por isso deixou de ser considerado o herói mais popular e célebre de toda a mitologia clássica.
         Héracles representa bem o quadro cultural que deve envolver o mundo do desporto. Dotado de imenso vigor físico, a sua força era famosa. Derrotou monstros outrora invencíveis, conquistou cidades e os seus reis, até foi capaz de vencer em combate os próprios deuses. No entanto, os seus feitos mais famosos foram “Os doze trabalhos” que efectuou a mando da deusa Hera.
         Héracles simboliza o Homem em luta contra as forças da natureza, representa a cultura de superação e de excelência que deve envolver o mundo do desporto, pois foi ele que organizou os jogos em honra de Zeus.
         Héracles e as suas heróicas aventuras constituíram um dos temas mais populares entre os artistas gregos. Os seus atributos habituais eram a barba, a pele de leão, a clava e um olho mais saliente, se bem que este último se vai tornando menos evidente ao longo dos tempos, o seu aspecto torna-se mais humano com o passar dos séculos, e passa a ser muitas vezes representado sem a barba ou sem as suas armas características.

AS SUAS ORIGENS
         Acredita-se que o seu nome de nascimento era Alcides, ou mesmo Alceu como o seu avô, nome que evoca a ideia de força física. O nome Héracles foi-lhe imposto por Apolo, no momento em que ele se tornou criado de Hera por intermédio do seu primo Euristeu. Héracles significa “a glória de Hera”, porque os trabalhos que ele empreendeu serviram para a glorificação da deusa.
         Pela mãe e pai «humano», Anfitrião, Alcides pertence à estirpe de Perseu, porque os seus dois avós eram ambos filhos de Perseu e Andrómeda.
         Anfitrião tivera de deixar a Argólida e estabelecer-se em Tebas, por causa de um homicídio involuntário. Aproveitando-se da sua ausência, Zeus seduziu Alcmena (tomando a forma de Anfitrião) no decurso de uma noite que durou 24 horas, pois Zeus ordenou ao Sol que não se levantasse. Anfitrião regressou na noite seguinte e fez outro filho a Alcmena, Íficles.
         Antes do nascimento das crianças o ciúme de Hera manifestou-se. Zeus informou que “a criança que ia nascer, da estirpe dos Perseidas, reinaria em Argos”. Hera tratou de adiantar o nascimento do seu primo Euristeu, que nasceu com 7 meses, e em virtude da palavra de Zeus, Euristeu ficou rei de Ardos e senhor de Alcides.
         Quando Alcides tinha 8 meses, Hera enviou duas serpentes para o quarto dele, a fim de sufocá-lo no berço, mas este agarrou as serpentes pela garganta e estrangulou-as.
         Foi criado como todas as crianças gregas, mas com a refinadíssima educação da época: condução de carros de guerra, lutas, armas, música e canto. O músico Lino ensinou-lhe os rudimentos das letras e das músicas, mas o aluno era indisciplinado, e um dia, quando o mestre o tentava corrigir, Alcides matou-o com uma pancada de tamborete.
         Enviaram-no para o campo, onde se tornou pastor. Aí aprende com Têutaro a arte de manejar o arco. Aos 18 anos realiza a sua primeira proeza, matou um leão que devastava a região de Citéron. Para o recompensar, o rei do país, Téspio, entregou-lhe as 50 filhas para ter netos do herói. Alcides teve 50 filhos, os Tespíades, que colonizaram, mais tarde, a sardenha.
         Na altura que regressava da caça ao leão, Alcides encontrou os enviados de Ergino, rei de Orcómeno, que vinham reclamar o tributo que os Tebanos pagavam ao seu soberano. Alcides cortou-lhes o nariz e as orelhas e mandou-os para a respectiva pátria. Ergino não apreciou a brincadeira e declarou guerra a Tebas, que venceu com a decisiva ajuda de Alcides. Porém a vitória custou a vida de Anfitrião que morreu durante a luta. O rei de Tebas, Creonte, deu a Alcides a sua filha Mégara, com quem teve cinco filhos.

OS DOZE TRABALHOS
         Alcides, durante um acesso de loucura provocado por Hera, matou os seus cinco filhos e Mégara. Procurou orientação junto ao Oráculo de Delfos, foi assim condenado a efectuar doze façanhas sobre-humanas sobe as ordens do seu primo Euristes, que estava ao comando de Hera. Foi aqui que o seu nome foi trocado para Héracles, que significa «a glória de Hera».
         É então que Héracles recebe armas: talha a clava em Nemeia, no tronco de um Zambujeiro; Hermes dá-lhe uma espada; Apolo, um arco e flechas.

O LEÃO DE NEMÉIA
         Este leão, filho de Ortro e irmão de Esfinge de Tebas, era de um tamanho descomunal e ainda por cima invulnerável. Devastava a região de Nemeia, devorando rebanhos e pessoas. Este leão habitava num covil com duas saídas, assim, Héracles obstruiu uma e, forçando o leão estrangulou-o nos seus braços. Morto o leão, Héracles esfolou-o utilizando as garras da fera e serviu-se da pele e da cabeça dele como couraça e capacete.
Recebeu, depois hospitalidade de um camponês pobre, Molorco, cujo filho havia sido morto pelo leão, e forneceu ao herói o seu único carneiro, para que em sinal de agradecimento, fizesse um sacrifício a Zeus. Nesse local, Héracles, em honra de seu pai, fundou os Jogos Nemeus.

A HIDRA DE LERNA
         Filha de Equidna e de Tifeu, a hidra de Lerna era uma serpente gigantesca e com cem cabeças, criada pela própria Hera. O seu hálito era fétido e mortal, tal como a sua picada. Héracles cortou-lhe as cabeças horrendas, mas elas voltavam a crescer à medida que eram decapadas. Encarregou Iolau (o sobrinho que o acompanhava) de queimar sempre a chaga com um archote, impedindo que voltasse a nascer. A última cabeça, que era imortal, foi colocada num buraco enorme em cima do qual Héracles colocou um gigantesco rochedo. Durante a luta, Hera enviou um gigantesco caranguejo para atrapalhar o herói, mas este simplesmente esmagou-o com o pé.
         Morto o monstro, Héracles embebeu as suas flechas no sangue da hidra, tornando-as eternamente venenosas.

A CORÇA DE CERÍNIA
         A corça vivia no monte Cerínia, e tinha chifres de ouro e pés de bronze. Era extremamente veloz, nunca se cansava e pertencia à deusa Ártemis, a quem fora consagrada.
Héracles tinha de captura-la viva, e perseguiu-a durante um ano, até aos confins do mundo. O herói conseguiu finalmente alcança-la quando ela atravessava um rio. No retorno a Micenas encontrou-se com Ártemis e Apolo, seus irmãos, e ambos estavam bastante irritados com a captura da corça. Héracles mostrou-lhes que o animal estava vivo e bem, e disse que tinha agido sob as ordens de Euristeu e, indirectamente de Hera. Deixaram-no seguir em paz.

O JAVALI DO ERIMANTO
         Este javali escondia-se no Monte Erimanto, onde atacava e devastava as vizinhanças, matando muita gente. Era gigantesco e de grande ferocidade, mas conforme as ordens de Euristeu, tinha de ser capturado vivo. Héracles encontrou-o num campo coberto de neve. Depois de cansa-lo, dominou-o e levou-o a Euristeu. O herói que estava mal-humorado por o seu amigo Folo ter morrido, entrou no palácio com o javali. Euristeu, quando viu o animal, teve tanto medo que se escondeu numa jarra enterrada.

AS CAVALARIÇAS DE AUGIAS
         Havia em Élis um rei chamado Augias, que era filho do Sol. Tinha muitos rebanhos do pai, mas não retirava o esterco dos estábulos, votando assim à esterilidade do solo do país. Héracles foi incutido de limpa-los, mas antes fez um acordo com o rei, seria pago se concluísse a tarefa num só dia.
         O mau cheiro era tão intenso que não permitia a aproximação de ninguém, mas o herói desviou o curso dos rios Alfeu e Peneu na direcção dos estábulos e, em um só dia, a forte corrente limpou todo o estrume acumulado.
         Augias recusou-se a pagar o acordo e expulsou Héracles. Este quando acabou os doze trabalhos matou Augias e pôs o filho do rei, Fileu, a reinar.

AS AVES DO LAGO ESTÍNFALO
         Na região do Lago Estínfalo, uma espessa floresta abrigava um bando de aves que tinham fugido outrora, perante uma invasão de lobos. Elas devoravam todos os frutos e até atacavam pessoas. Euristeu ordenou que Héracles as destruísse. Para força-las a deixar o bosque, recorreu a címbalos de bronze que Atena lhe dera. Com o barulho as aves levantaram voo e Héracles matou-as com as suas flechas. Há outra versão em que essas aves eram abutres que devoravam e varavam os homens, lançando penas de aço sobre as vítimas.

O TOURO DE CRETA
         O rei de Creta, Minos, era filho de Zeus e possuía um touro enorme e belíssimo, saído do mar, que prometera a Posídon sacrificar. Mas o rei voltou atrás e o deus vingou-se enlouquecendo o touro que havia escapado e agora furioso, devastava os campos de Creta.
         O touro tinha que ser levado a Euristeu. Héracles foi a Creta, obteve permissão de Minos e alcançou o touro na corrida. Depois, levou-o de volta à Grécia e deu-o a Euristeu que o ofereceu a Hera. A deusa recusou a oferta e soltou-o nos campos. Mais tarde, o touro foi abatido por Teseu.

AS ÉGUAS DE DIOMEDES
         Diomedes era filho de Ares e rei da Trácia. Possuía quatro éguas ferozes, carnívoras e antropófagas, que alimentava com os estrangeiros que apareciam nas suas terras. Héracles invadiu o palácio de Diomedes, dominou os serviçais, matou os guardas, capturou Diomedes e apoderou-se das ferozes éguas. Ia já a leva-las a Euristeu, quando se apercebeu que as éguas estavam famintas. Sensibilizado com o sofrimento dos animais, serviu-lhes o próprio Diomedes.                  

O CINTO DE HIPÓLITA
         A rainha das Amazonas, Hipólita, recebera de Ares um precioso cinto, cobiçado pela filha de Euristeu, sacerdotiza de Hera. O rei de Micenas encarregou Héracles de trazer o cinto de Hipólita, e o herói emborcou para Temiscira junto com Teseu, Télamon, Peleu e outros companheiros.
Héracles já tinha convensido a rainha Hipólita a ceder-lhe o cinto, quando a deusa Hera, disfarçada, convenceu as Amazonas a lutar. Julgando-se traido, Héracles matou Hipólita.

OS BOIS DE GÉRION
         Gérion era um gigante de três cabeças, filho de Crisoar, ajudado pelo cão Ortro, que possuia várias cabeças, guardava a Ilha de Eriteia, onde tinha enormes rebanhos de bois vermelhos. Euristeu mandou Héracles trazer-lhe esses bois.
         A ilha, situada no Extremo Oriente, para lá do Oceano, tinha de ser atravessado por Héracles. O herói pediu emprestado o Cálice do Sol, embarcação da qual se servia o astro, todas as tardinhas para voltar ao seu palácio, na outra extremidade do mundo. Para obter tal emprestimo, Héracles teve de ameaçar o Sol com flechas e intimidar o Oceano, para evitar ser sacudido demasiado pelas ondas durante a travessia. Por fim chegou à ilha sagrada, matou à mocada o cão Ortro, o pastor e por último o dono dos bois.
         O retorno a Micenas doi dificil, pois o rebanho era enorme e muitos ladrões tentaram rouba-lo. Euristeu sacrificou o rebanho a Hera, ela aceitou.

OS POMOS DE OURO DAS HEPÉRIDES
         Euristeu pediu as maças de ouro do Jardim das Hespérides, as Ninfas do Entardecer, que estava guardado por um dragão com cem cabeças. Héracles partiu para o país delas. O caminho estava um pouco complicado de se encontrar, até que Héracles soube que o único que poderia colher as maçãs era Atlas. Assim sendo foi ao seu encontro. Atlas estava condenado a carregar o céu aos ombros, e Héracles ofereceu-se para substituilo enquanto o outro iria apanhar os pomos. Atlas trouxe consigo as maçãs, declarando então que ele próprio iria levá-las a Euristeu. Héracles fingiu concordar com isso, pedindo apenas que Atlas pusesse uma almofada ao ombro. Este aceitou, e enquanto sustentava o céu, Héracles escapuliu-se, colheu as maças e deixou Atlas com o seu fardo. Euristeu consagrou os frutos a Atenas, mas esta mandou Héracles devolve-los ao jardim, pois o Destino proibia que os frutos estivessem noutro lugar.

CÉRBERO, O GUARDIÃO DO HADES
         Este trabalho conduziu Héracles aos Infernos, para buscar o cão Cérbero. Antes de partir, fez-se iniciar nos mistérios de Elêusis, que ensinava aos fiéis os meios de chegar e regressar do reino de Hades.
Héracles passou pela boca do Inferno, situada no cabo Ténato. Algumas sombras tentaram barrar-lhe a passagem, mas o herói suplantou os obstáculos e apresentou-se ante Hades, o qual acedeu dar-lhe Cérbero se ele conseguisse domá-lo com as mãos, o que Héracles fez. Levou o cão a Euristeu, que apavorado fechou-se no seu esconderijo subterrâneo. Não sabendo o que fazer ao cão, Héracles restituiu-o a Hades.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Joan Miró

Um homem misterioso que raramente se expunha, embora admitisse que esse traço do seu carácter ia-se modificando. Foi alguém que se quis apagar atrás da tela e deixar transparecer somente a sua obra, onde exibia os seus sonhos e criava um mundo tal como o via.
                Criou um mundo, através das suas telas que nos liberta da “preguiça mental” que ele detestava acima de tudo. Queria proporcionar ao observador a aprendizagem da liberdade, através dos seus traços e cores marcantes.
                Não pretendia que a sua obra fosse traduzida em palavras, pois palavra alguma seria capaz de traduzir a sua perturbação emocional.


Como Nasce um artista
                Joan Miró Ferrà nasceu dia 20 de Abril de 1893, em Barcelona. O seu pai era ourives-relojoeiro nos arredores de Tarragona e a sua mãe doméstica, filha de um carpinteiro de Palma de Maiorca. Teve apenas uma irmã, Dolores, por quem sentia uma grande ternura.
                Entrou para a escola "Calle Regomir", em 1900, onde inicia os seus estudos e cursos de desenho. Após a instrução básica e por insistência do pai, frequentou a Escola Comercial de Barcelona. Pouco depois, inscreveu-se na Academia de Belas-Artes "La Escuela de la Llotja", a mesma que Picasso havia frequentado alguns anos antes, tendo como professores Modesto Urgell (paisagista) e José Pascó Merisa (artes decorativas e aplicadas). Não foi um bom aluno e concluiu com dificuldade a escolaridade aos 14 anos. Aliás, desde criança gostava bem mais de desenhar e pintar, tendo aprendido com o pai, que também o motivou, a interessar-se pela astronomia. Os seus professores na Escola de Belas-Artes, influenciaram o jovem Miró quer ao nível da inspiração, quer no que respeita ao gosto pela liberdade artística. Sempre o aconselharam a seguir as suas próprias tendências. O pai seguia com interesse a aprendizagem de Miró, no domínio das artes decorativas e aplicadas, na esperança de que ele viesse a tornar-se um profissional de ourivesaria, como ele. E, na realidade, as artes aplicadas exerciam sobre Miró um enorme fascínio, sobretudo quando relacionadas com a arte tradicional da Catalunha.
                Joan Miró viveu a sua infância em Barcelona, mas as férias eram passadas em Tarragona, em Montroig e Palma de Maiorca. Para satisfazer a vontade do pai e depois de concluída a sua formação na escola comercial, abandonou os estudos e a pintura, empregando-se como ajudante de contabilista numa empresa de construção e de produtos químicos. Contudo, este não era de maneira nenhuma o caminho que queria seguir. Em 1910, sofreu uma depressão que o levou a um esgotamento nervoso, seguido de uma espécie de febre tifóide. Foi este o facto que convenceu o seu pai que ele não estava realmente vocacionado para o comércio ou mesmo actividades burocráticas. Tinha que deixá-lo seguir o seu próprio rumo. Para se restabelecer da doença, foi para a quinta que a família, adquiriu em Montroig, na região sul de Barcelona, que se tornou uma verdadeira inspiração para Miró.
                A partir dessa altura decidiu que se iria dedicar inteiramente à pintura, então matriculou-se numa escola de artes em Barcelona. Aprendeu a produzir desenhos usando o sentido do tacto, com os olhos vendados. Este método foi treinado com a ajuda dos professores Pasco e Galí e consistia em que os alunos, através do tacto, tivessem a percepção de um objecto para depois o reproduzir no papel. O objectivo era essencialmente libertar o artista da aparência real das "coisas" para melhor captar e reproduzir a aparência profunda das suas formas. Aprendeu também, a fixar de memória as paisagens quando se deslocavam com o professor. Este processo tinha como finalidade obrigar os alunos a reter as paisagens na memória, para mais tarde as reproduzirem, servindo-se apenas da sua memória visual. Também a educação musical fazia parte do programa da escola de Galí que formara um grupo coral próprio e organizava semanalmente concertos musicais. Os seus alunos tinham camarotes reservados nos concertos da Sociedade de Música de Câmara, em Barcelona. Estas actividades tornaram-se importantes na vida e obra de Miró. É a partir deste momento que começa a carreira artística de Joan Miró.

Primeiro contacto com as vanguardas
                Os primeiros trabalhos de Miró nasceram sob a influência das novas tendências da pintura moderna francesa – pós-impressionismo, cubismo, fauvismo – que se verificam em Barcelona no início do século XX. Não se conhecem muitas obras ou exercícios da sua vida académica. Miró inaugura a sua obra utilizando o que mais lhe interessa dessas primeiras vanguardas.

Quinta em Montroig
                Um dos fios condutores da obra de Miró é a sua grande ligação à terra, da qual tira energia como faz uma árvore através das raízes. Embora nascido em Barcelona, desde criança ia a uma província de Tarragona, de onde era natural o seu pai, e depois Montroig – onde a família comprou uma herdade – e Maiorca, terra natal da sua mãe. Esse universo telúrico surge com força numa série de quadros que costumam ser qualificados pelo seu intenso pormenor, pelo minucioso registo que neles se faz, desse idealizado mundo rural que alimenta a imaginação de Miró. Paisagens e objectos diversos aparecem sempre sob uma luz intensa e uniforme, como numa epifania dessa energia produzida pela terra.

A Experiência Surrealista
                Quando Miró se instala na oficina que Pau Gargallo lhe cede, em Paris, entra em contacto com o grupo de poetas e artistas que, provenientes da experiência dada, fundam em 1924 o grupo surrealista liderado por André Breton. Miró nunca foi um surrealista ortodoxo, mas o potencial que o movimento lhe oferece ao legitimar o inconsciente e o onírico como material artístico, serve-lhe para libertar a sua própria escrita pictórica, sintetizando os elementos.
                O mundo do imaginário e o inconsciente, mais que um fim, é para Miró um instrumento de medição pictórica, uma maneira de dar forma no quadro, à sua experiência vital e à sua memória.

Personagens
                Depois de assimilada a experiência surrealista, Miró cria uma iconografia própria com especial atenção para a figura humana. Seguem-se uma série de obras marcadas pelo traço livre e seguro, nas quais a cor e a forma constroem o quadro. A prática da colagem sugere-lhe novas formas a transportar para a tela. Os fundos dos quadros tornam-se geralmente escuros, provavelmente pela perturbação que provoca no âmbito do artista, o ambiente pré-bélico dessa época. As composições começam a aparecer com figuras deformadas e as extremidades dos corpos alargam-se.

Constelações
                Miró tinha-se estabelecido com a família em Varengeville, uma pequena povoação na costa normanda em 1939 e permanece lá até que o avanço das tropas alemãs o fazem decidir voltar para Espanha no ano seguinte. O desejo de evasão de uma realidade hostil e o contacto com a paisagem e a luz da Normandia, tão diferente do seu meio mediterrânico habitual, estão patentes numa série de vinte e três pequenas obras pintadas entre 1939 e 1941, que têm o título de Constelações. O céu com as estrelas são o principal motivo desta série realizada sobre papel molhado e enrugado, de forma que um emaranhado de linhas e pequenos ideogramas de cor, que aludem a pássaros, personagens alegóricas, estrelas e animais, activa uma superfície viva e texturada. A imagem do cosmos conduz o pintor para um registo topológico e expansivo do espaço, avançando, apesar do pequeno formato os sistemas de organização que se generalizam nas grandes telas  e em muitas outras posteriores.

Conquista de uma Linguagem Própria
                Com o regresso a Barcelona, em 1942, Miró encerra o turbulento período da Guerra Civil e da Segunda Guerra Mundial. A sua carreira orienta-se definitivamente a partir da exposição em Nova Iorque, que difunde a sua fama nos Estados Unidos, ao mesmo tempo que a sua escrita pictórica amadurece numa linguagem pessoal que vinha a ser moldada desde os anos 20. As Constelações serviram para fazer de todo o espaço do quadro uma superfície unitária integrando figura e fundo. Desde 1945 o seu vocabulário pessoal está perfeitamente codificado e nas pinturas desta época destaca-se a ligação dos fundos, nos quais a cor se integra com a textura do suporte definindo um espaço especificamente pictórico, ou autónomo.

Últimos anos
                Os últimos anos da carreira de Miró caracterizam-se pela abundante utilização do preto e pela despreocupação na aplicação da pintura sobre a tela, dando lugar a pingos e salpicadelas contínuas. A partir dos anos 70 as exposições sobre a sua obra sucedem-se a um ritmo crescente: a sua figura é reconhecida e valorizada em todo o mundo. A instantaneidade que segue nos seus quadros é inimitável, os temas a que alude sempre – terra, céu, mulher, pássaros – são já clássicos no século XX, expressos por meios – simplicidade na composição, traço seguro, cores essencialmente primárias – cuja universalidade demonstra a sua utilização posterior em âmbitos diferentes, como o do desenho gráfico publicitário.
         Na sua última fase parecia predominar a ausência de cor nos seus trabalhos, dedicando grande espaço ao preto e ao branco. Pensa-se que isso se deva a problemas visuais, comuns em idades muito avançadas.
                O artista trabalhou também com cerâmica e considerava isso muito gratificante pois possibilitava-lhe tocar e mexer nos objectos - vasos, pratos - que usava como suporte para o seu trabalho. Passou muitos anos a dedicar-se a isso e o resultado são trabalhos importantes dentro do contexto de sua vida, embora menos valorizados no universo dos museus e menos conhecidos do público. Fez ainda litogravuras e realizou a sua primeira viagem aos Estados Unidos para fazer um mural de grandes dimensões que ocupou nove meses de intenso trabalho. Diversificado, versátil, criativo.
               Criador de novas técnicas nos trabalhos de cerâmica e de uma maneira peculiar de exercer o ofício de pintor, Miró foi premiado com títulos e homenageado em todo o mundo, superando todas as dificuldades iniciais encontradas na juventude e no início da vida adulta. Na última fase de sua carreira foi regiamente pago por trabalhos encomendados e colocado na galeria dos grandes artistas.     
               Joan Miró morreu a 25 de Dezembro de 1983, aos 90 anos, em Palma de Maiorca, ainda em actividade.